Nos caminhos que
traçámos e percorremos, sozinhos ou acompanhados, deixámos marcas, nuns e
noutros, e sobretudo em nós próprios, que o tempo jamais apagará…
Todas as pessoas já tiveram experiências de
coincidências significativas ao longo da vida. Por vezes são acontecimentos
pouco relevantes, outras vezes são histórias que alteram completamente o rumo
dos nossos caminhos.
No meu caso acho que a coincidência mais
significativa relaciona-se com a família Pizarro.
De
facto, esta família esteve, de certa forma, ligada à opção que tomei em 1978 de
iniciar a carreira docente e estará muito provavelmente ligada a alguns dos
factores desmotivacionais que me levaram a pensar em abandoná-la.
Poderei também interpretar ou dizer que foi o
acaso. Mas que acaso é este que fez tanto sentido para mim naqueles momentos?
Que coincidência foi esta em que tudo pareceu obra maior para me conduzir ao
início e ao princípio do fim da minha carreira profissional?
Quanto ao início já tive oportunidade de explicar
o que aconteceu e o contexto que me levou a despedir-me
do meu primeiro emprego na Casa Pizarro
de Castro e dar um novo rumo à minha vida.
Quanto ao fim … tenho vindo a tentar explicar
todos os contextos políticos, sociais, profissionais e conjunturais que me
levaram a pensar que devo, oportunamente, tomar a opção de partir e deixar esta
carreira para sempre.
Esta família teve participação directa no contexto
pessoal que elevou a minha desmotivação e contribuiu decisivamente para as
decisões que viria a tomar posteriormente.
E de que maneira? Para responder a esta questão
falarei, de novo, no meu pai que também nasceu na aldeia de Pinhal do Douro, da
Freguesia de Vilarinho da Castanheira, Concelho de Carrazeda de Ansiães, em 23
de Março de 1923. Iniciou serviço de administrador agrícola para a Casa
Agrícola do Sr. António Pizarro de Castro, em 1 de Outubro de 1961, com um
contrato mensal no valor de 1500 escudos, com direito a casa e a todos os
produtos agrícolas necessários para a família.
Prestou serviço nessa casa agrícola durante 47
anos ininterruptos sem nunca ter gozado um fim-de-semana nem férias anuais.
Nunca durante todo este tempo recebeu subsídio de férias nem o 13º mês.
Foi internado no Hospital de Bragança em Outubro
de 2008, quando ainda se encontrava no activo, fazendo diversos trabalhos,
mesmo durante os cinco anos em que fez tratamento de hormonoterapia e
quimioterapia no IPO, do Porto. Nunca durante estes cinco anos de penosos
tratamentos faltou ao trabalho, excepto nos dias utilizados para os fazer.
De Julho a Setembro de 2008, enquanto os patrões
gozavam as suas férias, esteve ao serviço (já na fase terminal da sua doença)
assegurando penosamente o normal funcionamento da Casa agrícola. Durante este
período fez, pelo seu patrão, todo o tipo de pagamentos: desde os salários dos
trabalhadores agrícolas e do pastor, aos fornecedores de combustíveis, aos
fornecedores de produtos fitossanitários, etc., utilizando cheques e dinheiro
da sua conta bancária. Fê-lo no pressuposto (e/ou confiando) de que os seus
patrões, ao chegarem de férias lhe iriam restituir as importâncias adiantadas.
Foi ainda confiando na sua sincera amizade com
Luís Pizarro (principal herdeiro de António de Pizarro de Castro) que lhe
vendeu, a crédito, as uvas das colheitas de 2007 e de 2008, respectivamente, 19
697 Kg e 24 430 Kg.
Quando faleceu em 15 de Novembro de 2008, partiu
sem ter recebido os seus ordenados em atraso (vários meses), sem ter recebido
um cêntimo das ditas despesas que pagou pelo patrão, sem ter recebido a quantia
que lhe era devida pelas uvas que lhe vendeu e, sobretudo, sem se ter dado
conta da forma vil como foi usado e enganado pelo Sr Luís Pizarro, de quem ele
tanto gostava e que serviu incondicionalmente, com honestidade,
profissionalismo, dedicação e fervor.
Nós,
os herdeiros, aguardámos pacientemente pelo acerto de contas. Esperámos e
esperámos. Em vão. Nunca o Sr. Luís Pizarro de Castro de dignou tomar a
iniciativa de nos pagar aquilo que ficou a dever a meu pai.
Nesta conformidade, fomos forçados ao fim de um
ano e de várias reuniões mal sucedidas, convocadas por nossa iniciativa, a
lutar nos locais próprios. Com a arrogância e deselegância de quem nunca se
adaptou à democracia e ao estado de direito em que vivemos actualmente foi
protelando (com desculpas infantis e débeis argumentos) o pagamento das
importâncias que nos devia.
Finalmente e por intermédio do seu advogado
chegámos a um acordo "amigável".
Fizemos
esse acordo ratificado em Março de 2010 no Cartório Notarial de Alfândega da
Fé, aceitando perder parte da dívida sobretudo por duas razões: Por respeito à
memória de meu pai que tanto adorava essa família (vá-se lá saber porquê!) e
devido à idade avançada de minha mãe, que iria ser exposta a um enorme desconforto,
desgaste psicológico e sofrimento permanente até à resolução quase sempre
demorada dos tribunais.
Pelos mesmos motivos desistimos também do processo
nº 308/09.0, do Tribunal de Bragança que foi instaurado a nosso pedido e em que
Luís Pizarro era arguido.
Foi uma luta que durou mais de três anos e e teve
vários desenvolvimentos. Nunca me esquecerei da mesma pois deixou as suas
marcas e estou certo que um dia irá fazer parte de algum tipo de publicação com
direito a documentos de "apoio".