sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Escola C+S de Vila Flor

A Escola C+S de Vila Flor
Em 1980, encontrei na Escola C+S de Vila Flor, agora como colega, o antigo director do então Colégio Nossa Senhora de Sta Luzia, Padre Dimas Fais, que era também um dos seus proprietários. Esse Colégio era particular e funcionava exactamente neste mesmo edifício.
Leccionava, nesse ano lectivo, Educação Moral Religiosa e Católica mas tinha sido meu professor de Português e de Francês desde o 1º ao 5º ano do Liceu.
Ao recuar para os anos 60 recordava-me de que, como director desse Colégio, me tinha aplicado penas de suspensão das aulas durante 3 dias em duas situações diferentes, num total de seis dias. No seu papel de director, suspendeu-me sumariamente, sem qualquer inquérito, sem dar importância aos meus argumentos de então e sem me dar sequer a oportunidade de me defender de forma justa e imparcial.
Da primeira vez, resultou do facto de eu ter partido, sem querer, os óculos de um colega mais novo. Ao rematar à baliza fi-lo mal (como habitualmente) acertando na cara do Vítor Sil que se encontrava a uma pequena distância do lado esquerdo da baliza e … pimba, lá se foram os óculos!
O pior foi depois!!!
Descontrolado o Vítor (que teria 11 ou 12 anos) insultou-me, chamou-me filho da p... e eu, tentando acalmá-lo por um lado, mas zangado por outro, fui duro com ele ralhando-lhe por ele me estar a insultar. Furioso e a chorar, saiu dali e foi participar de mim à Direcção do Colégio. Como o Padre Cassiano não se encontrava, quem tomou conta da ocorrência foi o meu “amigo” professor Edral a quem chamávamos de doutor mas que não tinha, por essa altura, mais do que o antigo sétimo ano do liceu.
Tinha por ele uma clara e antiga antipatia que, aliás, era recíproca.
Foi meu professor de Português, Inglês e História ao longo de todo o 2º e 3º ciclo (do antigo 1º ao 5º ano do liceu). Exercia a actividade docente com a formação académica que tinha adquirido pela frequência do Seminário, em Bragança.
Este frustrado candidato a Padre teve sempre uma postura de prepotência e de autoritarismo primário para com os alunos das classes mais desfavorecidas e, pelo contrário, uma atitude de subserviência em relação aos alunos filhos das classes mais altas, a quem tratava humildemente por você. Estavam entre estes as filhas do Dr Artur Vaz, também nosso professor de Físico-Químicas e de Matemática; os filhos do Sr Celso Vaz, farmacêutico e irmão do Dr Artur; os filhos do Dr. Pimentel, médico e ex-presidente da Câmara, as filhas do Dr Silva, Veterinário e … também nosso professor de Ciências da Natureza, Geografia e Desenho e, ainda, os filhos dos ricos proprietários agrários da região.
Ele entrava invariavelmente nas salas de aula a trautear canções sem qualquer sentido visível ou conteúdo perceptível. As mais frequentes eram: “Oh do lírio branco, oh do lírio roxo, quem casar com um manco, tem que casar com um coxo … oh do lírio branco …oh do lírio roxo…quem casar com …; ou:“Aldininha se morreres a quem deixas o anel? Deixa-o aqui ao teu primo Manel… que bem precisa de… papel …Aldininha se morreres (…)”.
O Amândio Trigo de Carvalho d’Egas, meu companheiro e amigo, o Celso Bernardino, de Sampaio e eu éramos as suas vítimas predilectas. Muitas vezes utilizava a humilhação como arma. Costumava levantar o dedo indicador e dizer: um sustenido; depois levantava o dedo médio e dizia: dois sustenidos; levantava o anelar e dizia: três sustenidos e, de seguida, agredia por três vezes seguidas, com toda a força dos seus três dedos espetados, a cara de um de nós, rindo-se de gozo.
Quando soube quem ia tratar do assunto, senti-me desde logo condenado pelo acto recíproco de violência, mas normal entre jovens adolescentes e ainda por cima tratando-se de um caso isolado entre dois amigos que já éramos e ainda hoje somos, felizmente.
Para esse professor e para muitos outros dessa época quem gostava de jogar à bola assinava a sua sentença condenatória nos estudos, como se uma coisa tivesse a ver com a outra. Mas era assim, alimentado pela tacanhez de um professorado (?) que só via vírgulas, estrofes e equações. Futebol e desporto em geral eram sinónimos de burrice, de ignorância e de estupidez.
Ora, o “doutor” Edral, que foi simplesmente o pior professor e o pior cidadão sob o ponto de vista moral que eu tive a oportunidade de conhecer em toda a minha vida, agiu da forma mais pedagógica que ele conhecia. Ou seja, mesmo antes de ouvir a minha versão dos factos, telefonou para o pai do Vítor, que era funcionário na Repartição de Finanças e, também, para o Posto da Guarda Nacional Republicana. Em consequência, passados aí uns dez minutos, aparecem no Colégio dois Agentes da GNR e –claro- o pai do Vítor, naturalmente preocupado e sobretudo assustado pelo telefonema, enquanto que eu era ladeado pelos zelosos guardas, fui arrastado e levado para o Posto da GNR, para aí explicar o que tinha acontecido!!!
O pai do Vitor logo que tomou conhecimento in loco do problema teve a atitude pedagógica de acalmar o filho e, mostrando-se compreensivo para comigo, remeteu para mais tarde uma conversa que viria a ter com o meu pai. Posto isto foi-se embora para o seu local de trabalho.
No dia seguinte, fui chamado ao Gabinete do Director do Colégio que me pediu para ir chamar meu pai. Este, logo que pode, lá se deslocou e foi informado sem grandes delongas, na minha presença, que teria de pagar os óculos e eu teria que ficar um dia de castigo em casa por ter partido os óculos e ter, ainda por cima, maltratado a vítima.
O meu pai humildemente, como era seu timbre, aceitou sem retorquir, sem colocar nada em causa, sem saber se efectivamente eu tinha, ou não, culpa de tudo o que ocorreu.
Mas eu não aceitei e disse muito enervado e revoltado:
-Senhor Padre, isso é injusto! Se me deixar … posso explicar …eu chutei a bola para a baliza e o Vítor é que estava num local que não deveria estar! A bola bateu-lhe sem eu querer!
-Então por que razão lhe ralhaste e gritaste, em vez de o acalmar?
-Porque me insultou, me atirou com uma pedra e chamou nomes feios à minha mãe! E porque razão o Dr. Edral chamou o pai do Vítor e não chamaram o meu? Porque fui arrastado por dois guardas para o Posto da GNR? O meu pai paga as propinas neste Colégio! Tenho o direito de cá andar! Os problemas que surgem entre alunos devem ser resolvidos aqui dentro! Não sou criminoso nem cometi qualquer crime!
O Padre, espantado com meus os argumentos, virou-se para o meu pai e disse:
- Está a ver a insolência do seu filho? Pois, em vez de um dia, vai ficar 3 dias em casa! E virando-se para mim com três dedos da mão direita espetados na minha cara, vociferou:
- Estás a ouvir? Três …três … três dias! Ouviste bem?
O meu pai, sem protestar, sem me condenar mas também sem me defender, lá acabou por pagar os óculos.
Fiquei em casa os três dias com sentimentos de raiva e de revolta. E também com sentimentos de tristeza e de alegria. Tristeza por me terem privado injustamente daquilo a que tinha direito – a frequência das aulas - e de contentamento por ter ficado afastado dessa “gente”. 

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